segunda-feira, 22 de novembro de 2010
Coisas invisiveis.
E o meu corpo já cansado desfaleça
Jamais irei desanimar, nem desistir de continuar
Pois o Espírito de Deus se renova em mim
E a cada dia eu me fortaleço mais assim
Eu não olho para as coisas que hoje posso ver
Que não duram muito tempo e logo vão passar
Mas eu olho para as coisas invisíveis
Pois jamais acabarão
São sublimes, eternais
Meu sofrimento aqui é tão pequeno
Minha aflição tão curta e passageira
Se eu pudesse comparar com a glória eterna que virá
Pois as bênçãos lá do céu
Que meu Deus preparou
São bem mais, são muito mais do que eu posso imaginar
Eu não olho para as coisas que hoje posso ver
Que não duram muito tempo e logo vão passar
Mas eu olho para as coisas invisíveis
Pois jamais acabarão
São sublimes, eternais
Composição: Wendel Matos
sexta-feira, 12 de novembro de 2010
Aonde está Deus, está o amor
Mikail estava sempre muito ocupado, pois trabalhava com perfeição, usava material de boa qualidade, não cobrava caro e entregava no prazo prometido. Por isso todos o estimavam e nunca lhe faltava serviço.
Sempre fora um homem bom mas, ao envelhecer, começou a se preocupar com sua alma e queria se aproximar de Deus. Sua mulher tinha morrido quando ele ainda era aprendiz, deixando um filho de três anos. Haviam tido outros filhos antes, mas todos tinham morrido. Ao se ver só com o menino pensou em mandá-lo para a casa de um tio, na aldeia, mas ponderou: “Será muito triste para o pequeno Karp viver longe de mim. É melhor ficar mesmo comigo”.
Pouco tempo depois, despediu-se do patrão e abriu sua própria oficina. Deus, porém, não velava muito por seus filhos. Quando o que lhe restara se tornou rapaz e começou a ajudá-lo, adoeceu e morreu em uma semana.
Mikail enterrou o filho. A perda feriu-lhe de tal modo o coração que chegou a murmurar contra a justiça divina. Sentia-se tão infeliz que implorava a Deus que lhe tirasse também a vida. Censurava o Senhor por não levar a ele, que já era velho, em lugar do filho único tão querido, e deixou de ir à igreja.
Um dia, na época da Páscoa, chegou à casa do sapateiro um conterrâneo seu que há oito anos percorria o mundo como peregrino. Conversaram muito tempo e Mikail se queixou amargamente da sua desgraça.
- Perdi o desejo de viver, agora só espero a morte. Peço a Deus que me leve, pois não tenho mais ilusões na vida.
- Não fale assim, Mikail. Os homens não devem julgar a vontade do Senhor, pois suas razões estão acima do nosso entendimento. Se Ele decidiu que seu filho morresse e você vivesse, tem que ser assim. Você se desespera porque só quer viver para sua própria felicidade.
- E para que viver, se não para isso? - perguntou o sapateiro.
- É preciso viver para Deus. É ele quem dá a vida e para ele devemos viver. Quando entender isso, seu sofrimento terminará e você suportará tudo com paciência e resignação.
Mikail ficou calado por um momento, e disse:
- E como se vive para Deus?
- Como Cristo ensinou. Você sabe ler? Pode aprender nos Evangelhos. Na Sagrada Escritura você encontrará resposta para todas as perguntas.
Essas palavras calaram fundo no coração de Mikail. No mesmo dia comprou um exemplar do Novo Testamento, impresso em letras bem grandes, e começou a ler.
Pretendia pegá-lo somente nos dias de folga, mas o texto lhe trazia tal consolo à alma que foi adquirindo o hábito de ler algumas páginas todos os dias. Às vezes se entretinha de tal modo que só deixava o livro quando o óleo da lâmpada terminava.
Lia todas as noites. À medida que progredia na leitura, ia compreendendo com maior clareza o que Deus exigia, como viver para Deus, e a alegria penetrava docemente em sua alma.
Acostumado a ir se deitar gemendo e suspirando com a lembrança dos filhos, agora dizia:
- Glória a Deus, glória ao Senhor, pois essa foi a sua vontade.
A vida do sapateiro transformou-se completamente. Antes, nos dias de festa, ia para a taberna tomar chá e, por vezes, um gole de vodca com os amigos. Nessas ocasiões saía da taberna não propriamente embriagado, mas um tanto eufórico, e dizia bobagens, chegava a insultar quem encontrava no caminho.
Agora tudo mudara. Sua vida transcorria em harmonia e paz. Punha-se a trabalhar ao amanhecer e, terminado o dia, colocava a lâmpada sobre a mesa, tirava o livro da prateleira e sentava-se para ler. Quanto mais lia, melhor compreendia e uma suave serenidade envolvia-lhe a alma.
Uma noite estendeu a leitura até bem tarde e, chegando ao capítulo VI do Evangelho de São Lucas, encontrou os seguintes versículos:
“Ao que te ferir numa face, oferece-lhe também a outra. Ao que te tirar o manto, não o impeças de levar também a túnica. Dá a todo aquele que te pede; e ao que leva o que é teu, não lhe tornes a pedir. O que quereis que vos façam os homens, fazei-o também a eles”.
A seguir, leu que o Senhor disse:
“Por que me chamais: Senhor, Senhor, e não fazeis o que vos digo? Todo aquele que vem a mim, que ouve minhas palavras e as põe em prática, eu vos mostrarei a quem ele é semelhante. É semelhante a um homem que, edificando uma casa, cavou profundamente e pôs os alicerces sobre a rocha. Vindo uma inundação, investiu a torrente contra aquela casa e não pôde movê-la, porque estava bem edificada. Mas o que ouve e não pratica é semelhante a um homem que edificou a sua casa sobre a terra, sem fundamentos. Investiu a torrente contra ela e logo caiu, e foi grande a ruína daquela casa.”
Ao ler essas palavras, seu coração se inundou de alegria. Deixou os óculos sobre o livro e apoiou os cotovelos na mesa, imerso em reflexão. Comparou seus próprios atos a essas palavras, e disse:
- Minha casa está fundada sobre rocha ou sobre areia? Seria bom se estivesse apoiada na rocha. A felicidade nos domina quando estamos em paz com a consciência, procedendo como Deus quer. Quando nos esquecemos de Deus podemos cair outra vez em pecado. Continuarei como estou, pois sinto que é bom. Que Deus me proteja!
Mergulhado nesses pensamentos, resolveu ir se deitar. Mas relutava em largar o livro e começou o sétimo capítulo. Leu a história do centurião, a do filho da viúva e a resposta de Jesus aos discípulos de São João. Chegou ao trecho em que o rico fariseu convidou Jesus para ir à sua casa, onde a pecadora ungiu-lhe os pés e os lavou com suas lágrimas e Ele perdoou-lhe os pecados, e leu ainda:
“E voltando-se para a mulher, disse a Simão: Vês esta mulher? Entrei em tua casa, não me deste água para os pés; ela, com as suas lágrimas me banhou os pés, e enxugou-os com os cabelos. Não me deste o ósculo da paz; porém ela, desde que entrou, não cessou de beijar os meus pés. Não ungiste minha cabeça com bálsamo, porém esta ungiu com bálsamo os meus pés.”
Ao ler esse versículo, Mikail pensou: “Não lhe deu água para os pés, não o beijou, não ungiu a cabeça dele com bálsamo...” Tornou a tirar os óculos, colocou-os sobre o livro e voltou às reflexões. “Aquele fariseu deve ter sido como eu. Ele também só pensava em si mesmo - tomar o seu chá, estar agasalhado, confortável, nem um pensamento para o hóspede. Cuidava de sua vida e nem pensava no conforto do convidado. E quem era esse convidado? O próprio Deus! Se Ele viesse me visitar, eu faria a mesma coisa?”
Mikail apoiou a cabeça nos braços cruzados sobre a mesa e, sem se dar conta, adormeceu.
- Mikail! - disse uma voz de repente, sussurrando em seu ouvido. Despertou assustado. - Quem é? - perguntou.
Olhou em volta, olhou para a porta, não viu ninguém. A voz tornou a chamar, desta vez com mais clareza.
- Mikail, Mikail! Olha para a rua amanhã, pois eu virei.
Mikail levantou-se da cadeira, esfregando os olhos, sem saber se ouvira as palavras num sonho ou acordado. Apagou a lâmpada e foi dormir.
No dia seguinte levantou-se antes do amanhecer, fez suas orações e acendeu o fogo para preparar a sopa de repolho e o mingau. Mantendo acesa a chama do samovar, vestiu o avental e sentou-se junto à janela para trabalhar.
Não conseguia afastar o pensamento do que acontecera na véspera, sem saber se fora uma alucinação ou se alguém falara realmente.
- São coisas que acontecem na vida - disse a si mesmo.
Continuava a trabalhar, espiando de vez em quando pela janela e, quando passavam botas desconhecidas, levantava-se para ver o rosto da pessoa.
Passou um carregador calçando botas novas de camurça, passou um velho soldado do tempo de Nicolau, com botas de cano alto tão velhas e remendadas quanto ele próprio. Esse soldado chamava-se Stepanovitch. Morava na casa de um comerciante da vizinhança, que o acolhia por caridade. Para dar-lhe uma ocupação condizente com a idade avançada, encarregara-o de ajudar o porteiro.
Stepanovitch parou em frente à janela e, com uma pá, começou a tirar a neve da rua. Mikail olhou para ele e continuou a trabalhar.
- Sou mesmo um tolo - disse ele, rindo de si mesmo. - Stepanovitch está limpando a neve e imagino que Cristo vem me visitar. Estou delirando. Estou louco.
Mal tinha dado dez pontos, porém, voltou a olhar pela janela e viu a pá encostada à parede e o velho soldado tentando se aquecer. “Esse infeliz está muito velho - pensou Mikail. - Já não tem forças para tirar a neve. Uma xícara de chá lhe faria bem. E o samovar está fervendo.”
Cravou a sovela no tamborete, levantou-se, pôs o samovar na mesa, colocou mais água e deu uma pancadinha na janela. Stepanovitch virou-se. Mikail fez-lhe um sinal e foi abrir a porta.
- Entre. Venha se aquecer, você deve estar com frio.
- Valha-me Deus! Muito frio! Os ossos chegam a doer - disse o velho.
Sacudiu a neve dos pés, para não sujar o chão e quase caiu ao entrar, tão trôpego estava.
- Não se preocupe com a neve nos pés. Vou ter mesmo que varrer o chão; não faz mal sujá-lo. Venha, vamos tomar um chá.
Mikail serviu duas xícaras de chá escaldante e deu uma ao hóspede. Derramou um pouco no pires e soprou para esfriá-lo.
Ao terminar, o soldado colocou a xícara emborcada no pires e, em cima dela, o resto do tablete de açúcar. Agradeceu ao sapateiro, mas estava claro que tomaria de bom grado mais uma xícara do chá quente.
- Tome mais - disse Mikail, enchendo de novo as duas xícaras. A cada gole, olhava pela janela.
- Está esperando alguém? - perguntou o convidado.
- Se estou esperando alguém? Tenho vergonha de dizer a quem espero. Nem sei se tenho razão para esperar ou não, mas ontem à noite ouvi uma coisa que não me sai da cabeça. Se foi verdade ou fantasia, não sei. Sabe, meu amigo, ontem à noite eu estava lendo o Evangelho... Jesus sofreu muito entre os homens! Já ouviu falar nisso, não?
- Sem dúvida, já ouvi falar, mas sou ignorante, não sei ler...
- Pois eu estava lendo a história de Jesus na Terra e cheguei à parte em que ele foi à casa de um fariseu que não o recebeu bem... Depois fiquei pensando como seria possível não receber bem Jesus Cristo. Se acontecesse a mim, nem sei o que faria em sua honra! Mas o fariseu não o tratou bem. Enquanto pensava nessas coisas, adormeci. De repente, ouvi alguém dizer meu nome. Acordei, e parecia que alguém sussurrava: “Espere, que eu virei amanhã.” Disse duas vezes seguidas. E por incrível que pareça, apesar de ter vergonha de acreditar nisso, estou esperando a visita do Senhor!
O soldado balançou a cabeça sem nada dizer, terminou de beber o chá e emborcou a xícara, mas Mikail tornou a enchê-la.
- Tome mais, o chá faz bem. Acho que o Senhor nunca rejeitou ninguém, quando andava pelo mundo. Andava com os humildes, visitava os pobres. Os discípulos eram gente simples como nós, pescadores, artesãos. “O que se exalta será humilhado e o que se humilha será exaltado... Chamais-me Senhor e eu vos lavo os pés; aquele que quiser ser o primeiro deve ser o servidor dos demais. Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o reino dos céus.”
Stepanovitch tinha esquecido sua xícara de chá. Era um velho sensível. Ouvindo as palavras de Mikail, as lágrimas corriam pelo seu rosto.
- Vamos, tome mais - disse o sapateiro.
O soldado fez o sinal da cruz, agradeceu e, afastando a xícara, se pôs de pé.
- Agradeço muito, Mikail por me receber tão bem, satisfazendo ao mesmo tempo meu corpo e minha alma.
- Estou sempre ao seu dispor. Venha sempre que quiser, tenho prazer em recebê-lo.
- Quando Stepanovitch saiu, Mikail terminou seu chá e voltou a se sentar junto à janela para trabalhar.
Enquanto costurava, espiava pela janela pensando em tudo o que tinha lido, em tudo o que Jesus dissera.
Passaram dois soldados; um calçava botas do Governo e o outro botas dele mesmo. Depois passou um nobre de galochas e, em seguida, um padeiro carregando um cesto.
Apareceu uma mulher em meias de lã e sapatos de camponesa. Passou em frente à janela e encostou-se à parede. Através da vidraça, Mikail olhou para aquela desconhecida com uma criança nos braços, de costas para o vento. Em vão procurava abrigar a criança, pois não tinha com que envolvê-la. Apesar do frio, a mulher usava roupas de verão, velhas e gastas.
Junto à janela, Mikail ouvia o choro do bebê e via os inúteis esforços da mãe para consolá-la. Levantou-se, abriu a porta e, indo até a rua, gritou:
- Ei, ei, você! Está ouvindo?
A mulher voltou-se para ele.
- Não fique aí nesse frio com a criança. Entre aqui. Pode aquecê-lo melhor aqui dentro. Entre...
A mulher olhou, surpresa, aquele velho de avental e óculos na ponta do nariz que lhe fazia sinais para entrar, mas aceitou.
Desceram os degraus até o pequeno cômodo.
- Venha, sente-se aqui, junto ao fogão. Venha se aquecer para dar de mamar ao menino.
- Não tenho mais leite. Não como nada desde a manhã - disse a mulher, dando mesmo assim o peito à criança.
O sapateiro olhou para o outro lado. Pegou na mesa um pedaço de pão e uma tigela, foi ao fogão e encheu a tigela de sopa. Vendo que o mingau ainda não estava bem cozido, cobriu a mesa com uma toalha, pôs os talheres e serviu só a sopa e o pão.
- Sente-se, venha comer. Eu cuido do menino. Também já tive filhos, sei lidar com crianças.
A mulher fez o sinal-da-cruz, sentou-se à mesa e começou a comer. Mikail deitou o menino na cama e sentou-se ao lado. O menino chorava e Mikail fingiu ameaçá-lo, levando o dedo ao rostinho, mas sem tocá-lo, porque sua mão estava suja de alcatrão. Atento ao movimento do dedo, o bebê parou de chorar e começou a rir.
Enquanto comia, a mulher contou de onde vinha.
- Meu marido é soldado, mas faz oito meses que o levaram e não tenho notícias dele. Trabalhei como cozinheira, mas depois que o bebê nasceu não me quiseram mais. Não trabalho há três meses; já gastei tudo o que tinha. Tentei ser ama-de-leite, mas dizem que estou muito magra e não me aceitam. Fui à casa de uma mulher, onde minha filha trabalha, e me prometeram trabalho, mas só daqui a uma semana... Ela mora muito longe. Fiquei muito cansada e o bebê também. Minha patroa teve pena de mim e nos deixa dormir na casa dela, graças a Deus. Senão, não sei o que seria de nós.
- Não tem uma roupa mais quente? - perguntou o sapateiro.
- Não. Empenhei meu último xale de lã ontem, por vinte copeques.
A mulher foi até a cama pegar a criança. Mikail procurou entre as roupas penduradas na parece e encontrou um velho manto de lã.
- Tome. Está bem usado, mas serve para aquecer.
A mulher olhou para o agasalho, olhou para o sapateiro e, pegando o presente, desatou a chorar. Comovido, Mikail abaixou-se e pegou um bauzinho que estava sob a cama. Remexeu no baú e sentou-se diante da mulher.
- Deus lhe pague - ela disse. - Foi Ele quem me trouxe à sua janela. Não estava tão frio quando saí, mas agora meu filho estava quase congelando. Foi Deus que fez você olhar pela janela e ter compaixão de nós.
Mikail sorriu.
- Sim, foi Deus. Não olhei por acaso - e Mikail contou à mulher que ouvira a voz dizer que Jesus viria à sua casa.
- Tudo pode acontecer - disse ela, levantando-se.
Pegou o manto, enrolou o menino e agradeceu, inclinando-se diante do sapateiro.
- Tome isso, em nome de Deus - ele disse, passando à mão dela uma moeda de vinte copeques. - É para resgatar seu xale.
A mulher fez o sinal-da-cruz. Mikail imitou o gesto e acompanhou-a até a porta.
Depois da sopa, Mikail voltou ao trabalho. Enquanto manejava a sovela, espiava a rua. A cada vulto que se aproximava, levantava os olhos para ver quem era. Alguns eram conhecidos, outros não.
A certa altura, uma velha vendedora de maçãs parou em frente à janela. Restavam poucas maçãs na cesta; certamente já vendera a maior parte. Ela carregava nas costas um saco de gravetos que devia ter apanhado perto de alguma carvoaria e agora levava para casa. Parecia que o ombro lhe doía ao peso do saco e queria trocá-lo de lado. Deixou a cesta no vão da janela e pôs o saco no chão. Enquanto se ocupava em ajeitar os gravetos dentro do saco, apareceu um garoto e roubou uma das maçãs. Antes que conseguisse fugir, a velha agarrou-o pela manga. Ele se debatia, tentando escapar, mas a velha arrancou-lhe o gorro e puxou seus cabelos. O garoto gritava e a velha estava furiosa.
Sem perder tempo em fincar a sovela, Mikail largou-a no chão e correu para a porta. Subiu os degraus aos tropeções, seus óculos caíram na correria e ele chegou à rua. A mulher batia no menino e puxava seus cabelos, ameaçando entregá-lo à polícia. O garoto continuava a se debater, negando o furto da maçã.
- Não tirei nada! Por que está me batendo? Me solte!
- Mikail separou os dois, segurou a mão do menino e disse:
- Solte-o. Perdoe o menino.
- Perdoar? Ele nunca vai se esquecer de mim. Vou levá-lo à polícia agora mesmo! Ladrão!
- Por favor, solte o menino. Ele não vai mais fazer isso. Deixe-o, em nome de Cristo.
A velha soltou o garoto. Antes que ele saísse correndo, Mikail segurou-o.
- Peça perdão e nunca mais faça isso. Eu vi você pegando a maçã.
O menino começou a chorar e pediu perdão, soluçando.
- Não chore. Tome, eu dou essa maçã para você - disse Mikail, tirando uma maçã da cesta e entregando-a ao menino.
- Está mimando demais esse ladrãozinho - disse a velha. - Seria melhor dar-lhe uma surra para ele se lembrar a semana inteira.
- Nós pensamos assim, mas Deus não nos julga assim. Se é certo surrar esse menino por causa de uma maçã, o que Deus terá que fazer conosco por causa de nossos pecados?
A velha ficou calada. Então Mikail contou-lhe a parábola do Senhor que perdoou a dívida do servo e o mesmo servo quis esganar um devedor. A velha e o menino ouviam, quietos.
- Deus nos ensina a perdoar - disse Mikail - para sermos perdoados. Perdoar a todos, e mais ainda a um garoto sem juízo.
A velha concordou com um aceno de cabeça e suspirou.
- É verdade - ela disse - mas eles estão muito mal-educados.
- Então nós, mais velhos, devemos educá-los melhor.
- Eu sempre achei - ela concordou. - Eu tive sete filhos, e só resta uma filha - e a velha contou que morava com a filha e os netos. - Já estou velha e fraca, mas trabalho muito para cuidar dos meus netos. São crianças lindas! Tão carinhosos comigo! Aksiutka, então, só quer ficar comigo. É só “vovozinha, vovozinha querida” - enquanto falava ia ficando comovida.
- Claro que foi só criancice - ela disse, referindo-se ao garoto. - Vai com Deus, meu filho.
Estava prestes a pôr o saco no ombro quando o menino disse:
- Deixe-me levar o saco para a senhora. Também vou para esse lado.
A velha aceitou e se foram. Ela nem se lembrou de cobrar a maçã a Mikail. O sapateiro ficou olhando os dois se afastarem, conversando. Entrou em casa, encontrou os óculos caídos na escada, inteiros, pegou a sovela e voltou a trabalhar. Logo não havia mais luz suficiente para costurar e Mikail viu passar na rua o acendedor de lampiões. “Preciso acender a lâmpada”, pensou. Encheu de óleo o candeeiro, pendurou-0 e continuou o serviço. Terminou uma bota, examinou-a e aprovou o trabalho. Guardou as ferramentas, arrumou os cordões e sovelas, varreu os retalhos e colocou a lâmpada na mesa. Pegou o Evangelho na prateleira. Pretendia continuar onde tinha parado na véspera, mas o livro se abriu em outra página. O sonho voltou-lhe à mente e julgou ouvir passos no canto mais escuro, mas não distinguia bem quem eram. Uma voz sussurrou em seu ouvido:
- Mikail, Mikail, não me conhece?
- Quem é você? - ele murmurou.
- Sou eu - disse a voz. - Sou eu - e Stepanovitch saiu sorrindo do canto escuro e desapareceu, desfazendo-se numa nuvem.
- Sou eu - disse a voz. E da penumbra saiu sorrindo a mulher carregando a criança, que também sorria, e desapareceram.
- Sou eu - disse a voz mais uma vez. Surgiram a velha e o garoto com uma maçã na mão e desapareceram sorrindo. O sapateiro sentiu uma intensa alegria no coração. Fez o sinal-da-cruz, pôs os óculos e começou a ler o Evangelho na página aberta.
“Tive fome e deste-me de comer; tive sede e deste-me de beber; eu era estrangeiro e me acolheste.”
No final da página, estava escrito:
“O que tiverdes feito pelo menor dos meus irmãos, é a mim que fizestes.”
Mikail compreendeu então que seu sonho fora verdadeiro. O Salvador viera à sua casa naquele dia e ele o havia acolhido.
(Léon Tolstoi - Conto escrito em vida).
segunda-feira, 8 de novembro de 2010
Entendemos tão pouco.
Era uma vez dois irmão que passaram a vida inteira na cidade e nunca haviam visto um campo ou um pasto. Decidiram-se, um dia, a fazer uma viagem para o interior. Enquanto caminhavam, observaram um fazendeiro arando a terra e ficaram intrigados com o que estava fazendo aquele homem.
E pensaram consigo mesmos: “ Que tipo de comportamento é esse? Esse sujeito fica o dia inteiro marchando para frente e para trás, escavando sulcos profundos na terra. Por que alguém iria destruir uma campina tão bonita assim?”.
À tardinha, tornaram a passar pelo mesmo local e viram o fazendeiro colocando as sementes nos regos.
Desta feita, pensaram: “O que está fazendo? Deve ser louco. Está jogando trigo bom dentro desses valões!”.
- O campo não é lugar pra mim. As pessoas agem como se fossem malucos. Vou voltar pra casa – disse um dos irmãos. E retornou para a cidade.
Mas o outro ficou e poucas semanas depois verificou uma mudança maravilhosa. Os pés de trigo começaram a brotar, recobrindo os campos com um verdor que nunca fora capaz de imaginar.
Tratou de escrever para o irmão a fim de que viesse ver aquele crescimento milagroso.
E o irmão voltou da cidade, ficando maravilhado também com as mudanças. Passados alguns dias, o verde dos brotos foi dando lugar ao dourado dos trigais.Só então compreenderam o trabalho do fazendeiro.
O trigo amadureceu completamente e o fazendeiro trouxe a foice e começou a ceifá-lo. O irmão que havia retornado da cidade não acreditou.
- O que estará fazendo este homem agora? Trabalhou o verão inteiro para cultivar este lindo trigal e agora está destruindo com as próprias mãos! Não passa mesmo de um doido varrido! Para mim já chega. Vou voltar para a cidade.
Mas o outro irmão tinha mais paciência. Ficou no campo e assistiu o trabalho de colheita, quando o fazendeiro levou o trigo para o celeiro. Observou o esmero com que ele separou o joio do trigo e o cuidado ao armazenar. E ficou estupefato ao constatar que a semeadura de um saco de trigo permitiu a colheita de todo um trigal. Só então compreendeu que havia uma razão por trás de cada ato do fazendeiro.
-É assim que são as coisas com os trabalhos divinos. Nós mortais enxergamos apenas o início do plano de Deus. Não somos capazes de compreender todo o propósito e objetivo final de Sua criação. Portanto, precisamos ter fé em Sua sabedoria.
sexta-feira, 5 de novembro de 2010
A Linha Mágica
"Era uma vez uma viúva que tinha um filho chamado Pedro. O menino era forte e são, mas não gostava de ir à escola e passava o tempo todo sonhando acordado.
- Pedro, com o que você está sonhando a uma hora destas? - perguntava-lhe a professora.
- Estava pensando no que serei quando crescer - respondia ele.
- Seja paciente. Há muito tempo para pensar nisso. Depois de crescido, nem tudo é divertimento, sabe? - dizia ela.
Mas Pedro tinha dificuldades para apreciar qualquer coisa que estivesse fazendo no momento, e ansiava sempre pela próxima. No inverno, ansiava pelo retorno do verão; e no verão, sonhava com passeios de esqui e trenó, e com as fogueiras acesas durante o inverno. Na escola, ansiava pelo fim do dia, quando poderia voltar para casa; e nas noites de domingo, suspirava dizendo: "Se as férias chegassem logo!" O que mais o entretinha era brincar com a amiga Lise. Era companheira tão boa quanto qualquer menino, e a ansiedade de Pedro não a afetava, ela não se ofendia. "Quando crescer, vou casar-me com ela", dizia Pedro consigo mesmo.
Costumava perder-se em caminhadas pela floresta, sonhando com o futuro. Ás vezes, deitava-se ao sol sobre o chão macio, com as mãos postas sob a cabeça, e ficava olhando o céu através das copas altas das árvores. Uma tarde quente, quando estava quase caindo no sono, ouviu alguém chamando por ele. Abriu os olhos e sentou-se. Viu uma mulher idosa em pé à sua frente. Ela trazia na mão uma bola prateada, da qual pendia uma linha de seda dourada.
- Olhe o que tenho aqui, Pedro - disse ela, oferecendo-lhe o objeto.
- O que é isso? - perguntou, curioso, tocando a fina linha dourada.
- É a linha da sua vida - retrucou a mulher. - Não toque nela e o tempo passará normalmente. Mas se desejar que o tempo ande mais rápido, basta dar um leve puxão na linha e uma hora passará como se fosse um segundo. Mas devo avisá-lo: uma vez que a linha tenha sido puxada, não poderá ser colocada de volta dentro da bola. Ela desaparecerá como uma nuvem de fumaça. A bola é sua. Mas se aceitar meu presente, não conte para ninguém; senão, morrerá no mesmo dia. Agora diga, quer ficar com ela?
Pedro tomou-lhe das mãos o presente, satisfeito. Era exatamente o que queria. Examinou-a. Era leve e sólida, feita de uma peça só. Havia apenas um furo de onde saía a linha brilhante. O menino colocou-a no bolso e foi correndo para casa. Lá chegando, depois de certificar-se da ausência da mãe, examinou-a outra vez. A linha parecia sair lentamente de dentro da bola, tão devagar que era difícil perceber o movimento a olho nu. Sentiu vontade de dar-lhe um rápido puxão, mas não teve coragem. Ainda não.
No dia seguinte na escola, Pedro imaginava o que fazer com sua linha mágica. A professora o repreendeu por não se concentrar nos deveres. "Se ao menos", pensou ele, "fosse a hora de ir para casa!" Tateou a bola prateada no bolso. Se desse apenas um pequeno puxão, logo o dia chegaria ao fim. Cuidadosamente, pegou a linha e puxou. De repente, a professora mandou que todos arrumassem suas coisas e fossem embora, organizadamente. Pedro ficou maravilhado. Correu sem parar até chegar em casa. Como a vida seria fácil agora! Todos seus problemas haviam terminado. Dali em diante, passou a puxar a linha, só um pouco, todos os dias.
Entretanto, logo apercebeu-se que era tolice puxar a linha apenas um pouco todos os dias. Se desse um puxão mais forte, o período escolar estaria concluído de uma vez. Ora, poderia aprender uma profissão e casar-se com Lise. Naquela noite, então, deu um forte puxão na linha, e acordou na manhã seguinte como aprendiz de um carpinteiro da cidade. Pedro adorou sua nova vida, subindo em telhados e andaimes, erguendo e colocando a marteladas enormes vigas que ainda exalavam o perfume da floresta. Mas às vezes, quando o dia do pagamento demorava a chegar, dava um pequeno puxão na linha e logo a semana terminava, já era a noite de sexta-feira e ele tinha dinheiro no bolso.
Lise também mudara-se para a cidade e morava com a tia, que lhe ensinava os afazeres do lar. Pedro começou a ficar impaciente acerca do dia em que se casariam. Era difícil viver tão perto e tão longe dela, ao mesmo tempo. Perguntou-lhe, então, quando poderiam se casar.
- No próximo ano - disse ela. - Eu já terei aprendido a ser uma boa esposa.
Pedro tocou com os dedos a bola prateada no bolso.
- Ora, o tempo vai passar bem rápido - disse, com muita certeza.
Naquela noite, não conseguiu dormir. Passou o tempo todo agitado, virando de um lado para outro na cama. Tirou a bola mágica que estava debaixo do travesseiro. Hesitou um instante; logo a impaciência o dominou, e ele puxou a linha dourada. Pela manhã, descobriu que o ano já havia passado e que Lise concordara afinal com o casamento. Pedro sentiu-se realmente feliz.
Mas antes que o casamento pudesse realizar-se, recebeu uma carta com aspecto de documento oficial. Abriu-a, trêmulo, e leu a noticia de que deveria apresentar-se ao quartel do exército na semana seguinte para servir por dois anos. Mostrou-a, desesperado, para Lise.
- Ora - disse ela -, não há o que temer, basta-nos esperar. Mas o tempo passará rápido, você vai ver. Há tanto o que preparar para nossa vida a dois!
Pedro sorriu com galhardia, mas sabia que dois anos durariam uma eternidade para passar.
Quando já se acostumara à vida no quartel, entretanto, começou a achar que não era tão ruim assim. Gostava de estar com os outros rapazes, e as tarefas não eram tão árduas a princípio. Lembrou-se da mulher aconselhando-o a usar a linha mágica com sabedoria e evitou usá-la por algum tempo. Mas logo tornou a sentir-se irrequieto. A vida no exército o entediava com tarefas de rotina e rígida disciplina. Começou a puxar a linha para acelerar o andamento da semana a fim de que chegasse logo o domingo, ou o dia da sua folga. E assim se passaram os dois anos, como se fosse um sonho.
Terminado o serviço militar, Pedro decidiu não mais puxar a linha, exceto por uma necessidade absoluta. Afinal, era a melhor época da sua vida, conforme todos lhe diziam. Não queria que acabasse tão rápido assim. Mas ele deu um ou dois pequenos puxões na linha, só para antecipar um pouco o dia do casamento. Tinha muita vontade de contar para Lise seu segredo; mas sabia que se contasse, morreria.
No dia do casamento, todos estavam felizes, inclusive Pedro. Ele mal podia esperar para mostrar-lhe a casa que construíra para ela. Durante a festa, lançou um rápido olhar para a mãe. Percebeu, pela primeira vez, que o cabelo dela estava ficando grisalho. Envelhecera rapidamente. Pedro sentiu uma pontada de culpa por ter puxado a linha com tanta freqüência. Dali em diante, seria muito mais parcimonioso com seu uso, e sé a puxaria se fosse estritamente necessário.
Alguns meses mais tarde, Lise anunciou que estava esperando um filho. Pedro ficou entusiasmadíssimo, e mal podia esperar. Quando o bebê nasceu, ele achou que não iria querer mais nada na vida. Mas sempre que o bebê adoecia ou passava uma noite em claro chorando, ele puxava a linha um pouquinho para que o bebê tornasse a ficar saudável e alegre.
Os tempos andavam difíceis. Os negócios iam mal e chegara ao poder um governo que mantinha o povo sob forte arrocho e pesados impostos, e não tolerava oposição. Quem quer que fosse tido como agitador era preso sem julgamento, e um simples boato bastava para se condenar um homem. Pedro sempre fora conhecido por dizer o que pensava, e logo foi preso e jogado numa cadeia. Por sorte, trazia a bola mágica consigo e deu um forte puxão na linha. As paredes da prisão se dissolveram diante dos seus olhos e os inimigos foram arremessados à distância numa enorme explosão. Era a guerra que se insinuava, mas que logo acabou, como uma tempestade de verão, deixando o rastro de uma paz exaurida. Pedro viu-se de volta ao lar com a família. Mas era agora um homem de meia-idade.
Durante algum tempo, a vida correu sem percalços, e Pedro sentia-se relativamente satisfeito. Um dia, olhou para a bola mágica e surpreendeu-se ao ver que a linha passara da cor dourada para a prateada. Foi olhar-se no espelho. Seu cabelo começava a ficar grisalho e seu rosto apresentava rugas onde nem se podia imaginá-las. Sentiu um medo súbito e decidiu usar a linha com mais cuidado ainda do que antes. Lise dera-lhe outros filhos e ele parecia feliz como chefe da família que crescia. Seu modo imponente de ser fazia as pessoas pensarem que ele era algum tipo de déspota benevolente. Possuía um ar de autoridade como se tivesse nas mãos o destino de todos. Mantinha a bola mágica bem escondida, resguardada dos olhos curiosos dos filhos, sabendo que se alguém a descobrisse, seria fatal.
Cada vez tinha mais filhos, de modo que a casa foi ficando muito cheia de gente. Precisava ampliá-la, mas não contava com o dinheiro necessário para a obra. Tinha outras preocupações, também. A mãe estava ficando idosa e parecia mais cansada com o passar dos dias. Não adiantava puxar a linha da bola mágica, pois isto sé aceleraria a chegada da morte para ela. De repente, ela faleceu, e Pedro, parado diante do túmulo, pensou como a vida passara tão rápido, mesmo sem fazer uso da linha mágica.
Uma noite, deitado na cama, sem conseguir dormir, pensando nas suas preocupações, achou que a vida seria bem melhor se todos os filhos já estivessem crescidos e com carreiras encaminhadas. Deu um fortíssimo puxão na linha, e acordou no dia seguinte vendo que os filhos já não estavam mais em casa, pois tinham arranjado empregos em diferentes cantos do país, e que ele e a mulher estavam sós. Seu cabelo estava quase todo branco e doíam-lhe as costas e as pernas quando subia uma escada ou os braços quando levantava uma viga mais pesada. Lise também envelhecera, e estava quase sempre doente. Ele não agüentava vê-la sofrer, de tal forma que lançava mão da linha mágica cada vez mais freqüentemente. Mas bastava ser resolvido um problema, e já outro surgia em seu lugar. Pensou que talvez a vida melhorasse se ele se aposentasse. Assim, não teria que continuar subindo nos edifícios em obras, sujeito a lufadas de vento, e poderia cuidar de Lise sempre que ela adoecesse. O problema era a falta de dinheiro suficiente para sobreviver. Pegou a bola mágica, então, e ficou olhando. Para seu espanto viu que a linha não era mais prateada, mas cinza, e perdera o brilho. Decidiu ir para a floresta dar um passeio e pensar melhor em tudo aquilo.
Já fazia muito tempo que não ia àquela parte da floresta. Os pequenos arbustos haviam crescido, transformando-se em árvores frondosas, e foi difícil encontrar o caminho que costumava percorrer. Acabou chegando a um banco no meio de uma clareira. Sentou-se para descansar e caiu em sono leve. Foi despertado por uma voz que chamava-o pelo nome: "Pedro! Pedro!"
Abriu os olhos e viu a mulher que encontrara havia tantos anos e que lhe dera a bola prateada com a linha dourada mágica. Aparentava a mesma idade que tinha no dia em questão, exatamente igual. Ela sorriu para ele.
- E então, Pedro, sua vida foi boa? - perguntou.
- Não estou bem certo - disse ele. - Sua bola mágica é maravilhosa. Jamais tive que suportar qualquer sofrimento ou esperar por qualquer coisa em minha vida. Mas tudo foi tão rápido. Sinto como se não tivesse tido tempo de apreender tudo que se passou comigo; nem as coisas boas, nem as ruins. E agora falta tão pouco tempo! Não ouso mais puxar a linha, pois isto só anteciparia minha morte. Acho que seu presente não me trouxe sorte.
- Mas que falta de gratidão! - disse a mulher. - Como você gostaria que as coisas fossem diferentes?
- Talvez se você tivesse me dado uma outra bola, que eu pudesse puxar a linha para fora e para dentro também. Talvez, então, eu pudesse reviver as coisas ruins.
A mulher riu-se. - Está pedindo muito! Você acha que Deus nos permite viver nossas vidas mais de uma vez? Mas posso conceder-lhe um último desejo, seu tolo exigente.
- Qual? - perguntou ele.
- Escolha - disse ela. Pedro pensou bastante. Depois de um bom tempo, disse: - Eu gostaria de tornar a viver minha vida, como se fosse a primeira vez, mas sem sua bola mágica. Assim poderei experimentar as coisas ruins da mesma forma que as boas sem encurtar sua duração, e pelo menos minha vida não passará tão rápido e não perderá o sentido como um devaneio.
- Assim seja - disse a mulher. - Devolva-me a bola. Ela esticou a mão e Pedro entregou-lhe a bola prateada. Em seguida, ele se recostou e fechou os olhos, exausto.
Quando acordou, estava na cama. Sua jovem mãe se debruçava sobre ele, tentando acordá-lo carinhosamente.
- Acorde, Pedro. Não vá chegar atrasado na escola. Você estava dormindo como uma pedra!
Ele olhou para ela, surpreso e aliviado.
Tive um sonho horrível, mãe. Sonhei que estava velho e doente e que minha vida passara como num piscar de olhos sem que eu sequer tivesse algo para contar. Nem ao menos algumas lembranças.
A mãe riu-se e fez que não com a cabeça.
Isso nunca vai acontecer disse ela. As lembranças são algo que todos temos, mesmo quando velhos. Agora, ande logo, vá se vestir. A Lise está esperando por você, não deixe que se atrase por sua causa.
A caminho da escola em companhia da amiga, ele observou que estavam em pleno verão e que fazia uma linda manhã, uma daquelas em que era ótimo estar vivendo. Em poucos minutos, estariam encontrando os amigos e colegas, e mesmo a perspectiva de enfrentar algumas aulas não parecia tão ruim assim. Na verdade, ele mal podia esperar."
Do Livro: O LIVRO DAS VIRTUDES
Muitas vezes em nossas vidas queremos que o tempo passe mais de pressa, muitas vezes temos justificativas até palpáveis para isso, mas será mesmo que devemos querer que as coisas ocorram mais rápido, o tempo se encurte?
Irei usar um pequeno exemplo, imagine um casal de jovens, que se amam, entretanto são impossibilitados de manter um relacionamento, pois são muito novos. Eles concordam em espera até a idade estabelecida, mas vamos supor que esse tempo dure um ou mais anos, o que fazer? Desrespeitar o que eles consideram certo? Ou querer que o tempo passe mais de pressa?
Em minha opinião nem um dos dois posso justificar a primeira com o seguinte exemplo bíblico presente em Gênese, meu exemplo é Jacó que passou cerca de 14 anos para se casar com a mulher que amava, na verdade foram 7 + 7. 7 anos para casar com a mais velha e mais sete para casar com que realmente o interessava, cumpriu o seu acordo com Labão, pai da Léia e Raquel. Ele esperou o tempo necessário.
Quanto a segunda é mais complicado, pois eu desconheço um exemplo tão conhecido quanto o de Jacó, mas tenho alguns versículos bíblicos para servi de base, Ec 11:9-10 nele mostra que devemos viver os dias de nossa mocidade, entretanto tudo o que fizermos prestaremos conta, esse é um pequeno exemplo, de que devemos aproveitar cada fase da vida, não podemos querer ser algo que não está inserido em nossa fase, por exemplo um menina de 7, 8 anos que quer se sentir uma adolescente, que usar maquiagem, que nem mulheres adultas deveriam usar, querem se sentir mais velhas, muitas dessas pensam assim por causa dos pais, da família... Muitas vezes me deparei com situações que eu considero erradas, por exemplo os atuais desfileis mirins, quem ja assistiu parte de um sabe que na maioria dos casos as crianças utilizam maquiagem forte, roupas não adequadas... tudo isso afeta a criança ela passa a acreditar que pode pular de fase, mas ela não pode tanto fisicamente quanto psicologicamente.
Podes me chamar de arcaico, mas considero que cada fase deve ser vivida dentro dos limites estabelecidos por Deus, mas o mundo prega o contrario prega que uma menina de 9 anos deve trocar suas bonecas por maquiagem, prega que uma adolescente de 13, 14 anos pode manter relações sexuais, prega que devemos sempre querer uma fase a mais se somos crianças adolescente, se adolescente adultos, mas quando chegamos aos 30 queremos que o tempo pare, mas ele não para, o que fizemos ou deixamos de fazer no passado ficou no passado, o máximo que podemos fazer é modificar um pouco as conseqüências desse passado, mas não mudá-lo.
Eu usei alguns exemplos e situações do cotidiano para chegar em um ponto: devemos viver cada fase da vida, claro dentro dos parâmetros de Deus, ai recai o antigo versículo presente em Ec 12 "lembra-te do teu Criador nos dias de sua mocidade" Deus não impedi que vivamos as nossas fases, mas ele pede que vivamos dentro do parâmetro estabelecido por ele, existe um capitulo da bíblia que é a síntese de tudo o que trabalhei ate aqui, é Ec 3 1:8
"Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu.
Há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou;
Tempo de matar, e tempo de curar; tempo de derrubar, e tempo de edificar;
Tempo de chorar, e tempo de rir; tempo de prantear, e tempo de dançar;
Tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar, e tempo de afastar-se de abraçar;
Tempo de buscar, e tempo de perder; tempo de guardar, e tempo de lançar fora;
Tempo de rasgar, e tempo de coser; tempo de estar calado, e tempo de falar;
Tempo de amar, e tempo de odiar; tempo de guerra, e tempo de paz."
Há tempo para tudo, aproveitamos nossas fases, nosso tempo nos caminhos de Deus.
Gostaria de lembrar de um filme chamado click, nele o protagonista Michael Newman (Adam Sandler) um arquiteto muito impaciente recebe um presente o contrele de sua vida, com ele poderia avança-la, mas Michael chega ao fim de sua vida e percebe que não pode desfrutar dela e pede que tenha ela de volta, mas dessa vez sem o controle.
Levando em consideração a lenda francesa apresentada, os versículos bíblicos e o exemplo do filme gostaria a retorna a meu primeiro exemplo, a do casal de jovens. Eles podem ter varias justificativas para adiantar a sua relação entretanto se os dois tem a consciência que não devem, eles tem que respeitar isso. Eles não devem desrespeitar e não devem querer que o tempo passe mais rápido ou mais devagar pois nessa fase mesmo separados, sem uma relação concreta podem tirar um grande proveito, eles podem refletir sobre os dois, e ja pode ser um meio de saber se o que eles sentem é uma mera paixão ou realmente é o dito amor. Eu usei como simples e um tanto banal, mas a parti dele podemos puxar outros mais complicados, seja alguém que esta passando por uma doença, por uma separação, por uma dificuldade profissional, por uma pressão, não importa. Não somos os donos do tempo, e tudo em baixo do céu tem um propósito.
Que aproveitamos as nossas fases nos caminhos do Senhor, que não tentemos pular de fases, pois cada uma se bem ultilizada servira para aperfeiçoar-nos.
Fique com iesus christos.
Ictus